Metroviários denunciam que mudança no sistema não corrigirá panes constantes nos trens. 'É só mais uma maneira de escondê-los da opinião pública, para fingir que não existem'
O Metrô de São Paulo resolveu dificultar o acesso de seus funcionários ao sistema de registro de falhas dos trens, conhecido como S-GUT. As restrições foram implementadas depois de reportagens de vários veículos de comunicação mostrarem falhas de segurança nas composições da frota K, recentemente reformadas por empresas envolvidas nas denúncias de cartel.
Há quatro meses RBA e Outras Palavras têm demonstrado como uma série de ocorrências vêm colocando em risco a integridade de funcionários e de usuários. Porém, entre as últimas últimas quinta (5) e sexta-feira (6), logo depois de a Rádio CBN ter publicado notícias sobre panes recorrentes na frota K, o Metrô resolveu restringir o acesso ao sistema. Baseada em dados obtidos por metroviários diretamente nos computadores da empresa, a reportagem repercutiu em outros meios de comunicação da capital, como O Estado de S. Paulo e Diário de S. Paulo, e desagradou seus diretores.
“Estavam programando alteração no software há mais ou menos um mês, talvez porque estávamos levantando informações e levando à imprensa”, afirma um dos funcionários do Metrô que tem repassado dados sobre falhas do sistema. “A alteração estava programada para a segunda quinzena de dezembro. Um dia depois das últimas reportagens, porém, já tinham mudado tudo. Não dá para afirmar que é por causa disso. Mas foi o que ocorreu.”
Até a semana passada, qualquer funcionário da área de tráfego do Metrô conseguia acessar o S-GUT sem maiores problemas. O sistema registra todas as falhas das composições em operação na malha metroviária da cidade. A partir dessas informações é possível verificar a quantidade e o tipo de panes apresentadas por cada trem, a data e a hora dos defeitos. É uma espécie de “ficha completa” das composições.
O S-GUT tem sido utilizado por funcionários da empresa para fazer denúncias de algumas falhas de segurança na rede – muitas delas graves. Diante do silêncio do Metrô sobre os constantes problemas nos trens, sobretudo nas frotas reformadas, a pesquisa informal de metroviários tem sido uma das poucas fontes de informação confiável sobre a situação da malha metroviária paulista. A empresa jamais conseguiu desmentir tais denúncias.
“O novo programa dá acesso ao número dos trens e a informações sobre se está na linha ou no pátio, com cores indicando se o trem está liberado para circulação, se está recolhido ou se está liberado com ocorrência de falhas”, continua o funcionário. “Mas não mostra de jeito nenhum o tipo de falha que há no trem. Não temos mais como saber o que está acontecendo.”
De acordo com o metroviário, agora, para entrar no sistema, que foi rebatizado de S-GUT 2 Web, o funcionário precisa submeter seu número de registro funcional e uma senha. Antes, essa identificação pessoal de acesso não era necessária, o que permitia aos empregados da companhia certo grau de anonimato. “Ficou mais arriscado conseguir informações.”
A disposição dos dados na tela também impede uma análise mais completa das falhas ao longo do tempo. “Você precisa escolher uma data e um horário específicos para visualização. E esse horário varia de dois em dois minutos. Fica impossível de fazer os levantamentos. Precisaríamos selecionar quase de minuto a minuto o que queremos ver”, lamenta.
“A empresa se fechou ainda mais. É uma total falta de transparência”, se queixa o metroviário, dizendo que a categoria aprova a divulgação das falhas na imprensa. “O Metrô está querendo abafar essas ocorrências, para que não tenha mais problema com os meios de comunicação. A mudança no sistema, porém, não resolve as falhas. É só mais uma maneira de escondê-los da opinião pública, para fingir que não existem.”
Procurado, o Metrô se recusou a responder às questões enviadas pela reportagem. A RBA quis saber se as alterações no sistema de registro de falhas guardavam relação com a publicação das denúncias sobre as panes nos trens novos e reformados, e se a empresa tinha como objetivo restringir o acesso de funcionários às informações. E também por quê a empresa decidiu modificar o programa.
“O aperfeiçoamento de normas e procedimentos é uma prática permanente do Metrô de São Paulo em busca da melhoria contínua de todas as áreas da companhia, sempre mantendo o foco no ganho de qualidade, eficiência e segurança”, afirmou a estatal, em nota, ignorando os questionamentos.
Até semana passada, sistema permitia que funcionários obtivessem informações de trens sob anonimato
Por Tadeu Breda, da RBA publicado
FOTO: MARLENE BERGAMO/ARQUIVO FOLHAPRESS