Estação Perus, Linha 7-Rubi da CPTM |
Essa iniciativa primeira no Estado de São Paulo, nos últimos anos do século passado, tinha por justificativa – a época de sua criação - “os elevados índices de acidentes verificados nos mais variados exercícios profissionais, com resultados por vezes até mesmo fatais para trabalhadores de todas as classes, constituindo essa reiterada vitimização fator comprometedor da vida econômica e social do Estado e, em consequência, da sua ordem pública”. Considerava, também, “que esta persistente forma de violência, além de macular a própria dignidade do trabalho, atenta contra a incolumidade das pessoas trabalhadoras, por vezes resultantes de ações ou omissões penalmente relevantes, cujas apurações, como constitucionalmente previsto, afiguram-se dever da Polícia Civil, assim no contexto geral das suas funções de defesa e de promoção dos direitos individuais”. Tampouco deixou de considerar “as inúmeras e lídimas manifestações e apelos de entidades representativas de trabalhadores, as quais, por intermédio de consternadores levantamentos estatísticos, conclamam maior rigor no exercício das atividades de polícia judiciária com vistas à repressão aos acidentes de trabalho criminosos”.
Mediante tais argumentos, a Portaria definia como atribuições da delegacia:
I – exercer função orientadora em relação às unidades policiais civis de base territorial, cuidando, outrossim, da edição de estudo normatizador, próprio ao estabelecimento de rotinas procedimentais padronizadas a serem adotadas nos casos de acidentes de trabalho, para, após aprovado pelo Delegado Geral de Polícia, ser distribuído à fiel observância das autoridades policiais em exercício nas unidades referenciadas;
II – prestar assessoramento às delegacias de polícia que tenham em curso procedimentos policiais para apuração de ilícitos de sua concorrente atribuição, servindo como órgão consultivo na matéria, sendo vedada à sua autoridade policial titular, contudo, assumir a presidência dos referidos procedimentos;
III – exercer atenta vigilância aos inquéritos policiais que versarem a respeito de acidentes de trabalho, facultando-lhe, através da autoridade titular, o acompanhamento do andamento de qualquer feito em trâmite nas unidades policiais de base territorial;
IV – manter estreito contato com órgãos públicos especializados na prevenção e/ou repressão aos acidentes de trabalho, buscando estabelecer interagente colaboração parta a exitosa realização de suas atividades fins.
Pois bem: qual não foi a surpresa do sindicato - imediatamente após o primeiro acidente na CPTM que vitimou dois trabalhadores, em 27 de novembro -, saber que essa delegacia especializada – agora denominada 3ª Delegacia de Polícia de Investigação sobre Infrações contra as Relações de Trabalho, contra a Organização Sindical e Acidentes do Trabalho - havia sido extinta por decreto assinado pelo governador Geraldo Alckmin em 28 de novembro (Decreto Lei 57.546), e publicado no Dário Oficial de 29 de novembro de 2011. Mais intrigante: o decreto não expõe as razões da extinção.
Coincidência ou não, é difícil entender e aceitar essa extinção, uma vez que – ao menos em nosso entendimento – as motivações que geraram a criação do órgão em 1997 perduram, talvez com maior incidência nos dias de hoje.
A investigação dos dois acidentes ficou por conta da Delegacia de Polícia do Metropolitano, que até hoje nada revelou.
Para nossa surpresa – embora positiva – soubemos que uma equipe da Vigilância Sanitária está apurando, inclusive com solicitação de nossa ajuda. Não sabemos, entretanto, qual será o encaminhamento posterior.
Quanto a CPTM, o sindicato teve que a ela endereçar dois ofícios – em diferentes datas -, lembrando que a participação da entidade na sindicância está prevista no Contrato Coletivo. A resposta - mas apenas depois do segundo -, veio expressa na forma de concordância, mas sem nenhuma data e local para efetivar tal participação.
Investigação e sindicância dos dois acidentes que vitimaram cinco trabalhadores na CPTM estão nesse pé.
Mais recentemente outro acidente, desta vez entre dois trens da CPTM, agora envolvendo passageiros. Por sorte, mera sorte, o número de passageiros naquele horário era pequeno, muito pequeno.
O porta voz da CPTM não soube nem mesmo dizer à sociedade como havia ocorrido o acidente. Explicou mal ao afirmar que os trens não estavam na mesma linha. Se não estivessem na mesma linha não haveria choque entre eles. Nem mesmo soube dizer que um dos trens estava em um desvio, aguardando a passagem do outro para entrar na via, e entrou no momento errado.
Agora, diante da enfática afirmação do secretário dos Transportes Metropolitanos de São Paulo (depois que o governador exigiu apuração), que o acidente não se deveu a defeitos no “sistema”, cabe até mesmo imaginar que a desinformação do porta voz tenha tido por motivo apenas evitar possível suspeita sobre a segurança dessa coisa etérea chamada “sistema”. Mais inteligente do que os gestores da CPTM, que correram para atribuir a causa das mortes aos próprios mortos nos dois primeiros acidentes, diz o secretário que é necessária cautela antes de responsabilizar o ou os maquinistas.
Incompreensível, entretanto, foi o argumento utilizado pelo secretário para isentar o tal “sistema” de qualquer responsabilidade (embora sua condição impessoal seja excelente para levar a culpa de tudo): a análise da “caixa preta”. Esqueceu o secretário que estamos falando de trens, e não de aeronaves. Não existe caixa preta, principalmente nos antigos trens da série 5000 envolvidos no acidente.
Como não é falha do “sistema”? Que sistema é esse que permite (com ou sem eventual negligência do ou dos maquinistas) que um trem saia de um desvio e entre na linha enquanto outro está transitando? Se existe o tal “sistema”, parece que não é propriamente o suprassumo da tecnologia em segurança ferroviária. Quantos outros buracos existem nesse queijo tão requintado chamado “sistema” da CPTM?
Afirmo e reafirmo: essa prática de escamotear, desconversar e manter a ilusão que usuários e ferroviários estão protegidos por um super-mega-hiper-master “sistema” de segurança ainda pode terminar em tragédia.
Se isso acontecer, antes que gestores da CPTM e instâncias do governo apontem os dedos na direção dos ferroviários, eles, os ferroviários e seu sindicato, apontarão os dedos na direção dos gestores da empresa e do governo, e dirão – “vocês sabiam, vocês sabiam...”
Éverson Paulo dos Santos Craveiro
Presidente do SINFERP
Fonte: Mundo Sindical