30 de março de 2014

Em 2 anos, usuários ‘bombardeiam’ Metrô de SP com ações na Justiça

Passageiros relatam lesões por causa de superlotação e freadas bruscas
Dados obtidos pelo ‘Estado’ por meio da Lei de Acesso à Informação mostram que 617 processos foram ajuizados em dez anos. Empresa alega aumento da demanda

A batalha judicial entre usuários e o Metrô disparou. Dados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), obtidos pelo Estado por meio da Lei de Acesso à Informação, revelam que 617 ações foram ajuizadas, nos últimos dez anos, por problemas como lesões sofridas no interior do sistema e questionamentos de valores oferecidos pela empresa em casos de desapropriação de imóveis. A grande maioria dos pedidos versa sobre indenizações por dano moral e decorrem principalmente da superlotação e das falhas recorrentes na rede.

Em pouco mais de dois anos, entre 2012 e o mês passado, foram ajuizadas 459 ações, o que representa 74% de todo o volume de processos desde 2004. Oficialmente, o Metrô credita o salto apenas à elevação da demanda no período, quando 57% a mais de passageiros passaram a ser transportados, segundo a empresa. Contudo, a quantidade de processos subiu em uma proporção muito maior. Dez anos atrás, só foram ajuizadas três ações dessa natureza, ante 186 em 2013 (veja mais no quadro nesta página).

A operadora de telemarketing Mayane Fabricia de Santana, de 20 anos, se diz vítima da superlotação. Ela se feriu ao cair com as duas pernas no vão do trem no momento do embarque na Estação Belém, no horário de pico da manhã. O acidente aconteceu há cerca de um ano e deixou queloides em suas pernas. "Doeu muito. Acho que o Metrô devia se preocupar mais com essa questão, colocar mais trens vazios passando", afirma.

Outro fator está por trás do aumento das ações. Trata-se das falhas e acidentes que acometem o serviço. Somente uma ocorrência, a batida entre dois trens na Linha 3-Vermelha, em maio de 2012, levou a uma avalanche de processos. Uma das afetadas naquela ocorrência e que decidiu processar a empresa é a enfermeira Laís Cossi, de 22 anos, que estava sentada no primeiro vagão do trem que colidiu com o outro que estava parado - o acidente foi o pior da história da operação da companhia, inaugurada em 1974.

"Bati a cabeça, outras pessoas caíram em cima de mim e o labirinto do meu ouvido estourou, tive de me afastar do emprego por uma semana. Além disso, perdi as provas na faculdade. A única pessoa que me ajudou a andar sobre os trilhos foi outro passageiro, que também estava machucado e sangrando", afirma Laís. De acordo com ela, o Metrô não lhe prestou o atendimento adequado. O caso ainda não foi julgado.

Patrícia Conceição da Silva Carvalho, balconista de 34 anos, feriu o braço na colisão e perdeu um dia de trabalho. "Acho errado o metrô estar sempre lotado. No dia da batida, o trem ficou com problema várias vezes e ninguém avisou nada", conta.

O advogado Ademar Gomes diz que existem outros processos em trâmite envolvendo falhas e panes do sistema, como paradas bruscas dos trens, que levam as pessoas a se machucar. No seu escritório, o episódio de 2012 rendeu 74 ações de indenização por danos morais ou materiais. "Esse tipo de processo leva uns cincos anos para terminar, e geralmente é causa ganha", afirma Gomes.


Responsabilidade. Na avaliação de Maurício Januzzi, presidente da Comissão de Sistema Viário e Trânsito da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), a responsabilidade pelo transporte seguro dos passageiros é uma atribuição exclusiva do Metrô. "Há um aumento das ocorrências, e as pessoas estão mais conscientes de seus direitos e de suas garantias, no sentido de obter a indenização por qualquer dano causado a elas", afirma o advogado.

Januzzi conta que a superlotação pode mesmo levar à abertura de processos na Justiça. "Tropeçar na plataforma, cair em virtude de freada brusca. A pessoa só precisa provar que estava naquele dia no transporte público. É possível fazer isso por meio do Bilhete Único", diz o advogado, uma vez que a tarifação é automatizada.

Leviano. Em nota, a companhia afirma que a tentativa de "analisar o volume de ações judiciais sobre o Metrô é leviana e superficial" e que "o aumento no número de ações judiciais contra o Metrô é proporcional à elevação do número de passageiros transportados e ao aumento no ritmo das obras de expansão da rede".

Ainda segundo a empresa controlada pelo governo do Estado, "no período citado, a média de passageiros transportados diariamente nas linhas de metrô cresceu 57%". A companhia também argumenta que "atualmente, existem quatro grandes empreendimentos em obras - segunda fase da Linha 4, prolongamento da Linha 5 e a implementação dos monotrilhos das Linhas 15 e 17 -, além das Linhas 6-Laranja, já contratada, 2-Verde e 18-Bronze, em processo de implementação".

"Quanto às indenizações por desapropriações", informa a nota, "elas são pagas seguindo exatamente a legislação vigente, com base nos valores indicados pelo Poder Judiciário".

Fonte: Estadão