O total de passageiros nas estações da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) cresceu 73% em cinco anos, segundo dados da empresa. Foram 117,1 milhões de passageiros nos dois primeiros meses de 2012, contra 67,8 milhões transportados no mesmo período de 2007. O número de usuários neste ano equivale a cerca de 3 mil vezes a capacidade do Estádio do Pacaembu - cerca de 40 mil, na Zona Oeste de São Paulo.
Na quinta-feira (29), uma falha no sistema elétrico da Linha 7-Rubi paralisou trens e terminou com a depredação da estação Francisco Morato. A Polícia Militar chegou a usar bombas e manifestantes foram detidos. Passageiros relataram que chegaram a demorar até 4 horas no percurso e flagraram cenas de vandalismo.
O Ministério Público informou que investiga falhas no serviço e especialistas apontam que há superlotação e necessidade de mais investimento. O secretário dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, anunciou obras de modernização no trecho afetado e afirmou que a inauguração da Linha 4 do Metrô e a consequente integração com os trens trouxe um "tsunami" de passageiros ao sistema.
Evolução da demanda
O número de 117,1 milhões considera a somatória de todos os passageiros transportados ao longo de janeiro e fevereiro deste ano.
Dados da CPTM relativos ao período entre 2006 e 2011 refletem também aumento se forem consideradas apenas o total de viagens em dias úteis. O total de usuários cresceu quase um milhão: passou de 1,4 milhão de pessoas em 2006 para 2,3 milhões em 2011.
Para o engenheiro Sérgio Ejzenberg, especialista em transportes, os dados refletem a superlotação das linhas. "Há sobrecarga de usuários, uma demanda enorme. O sistema [de trens] não está dando conta", diz.
Para Ejzenberg, as falhas ocorridas na Linha 7-Rubi nesta quinta não são pontuais - elas fazem parte de um problema maior, que desde o início do ano afeta os usuários da CPTM. "Talvez [a empresa] não estivesse esperando tanta demanda. Houve um erro de planejamento, de engenharia ou de orçamento", pondera o engenheiro. Uma falha ocorreu nos trens da CPTM a cada quatro dias nos três primeiros meses de 2012, segundo levantamento da TV Globo. No total, 22 problemas foram registrados.
Problemas como a pane no sistema elétrico dos trens da Linha 7-Rubi, que paralisaram os trens e causaram tumulto, afetam mais gente do que só os passageiros, afirma Ejzenberg. "O custo social é enorme. Há pessoas que não chegam no trabalho, professores que deixam de dar aula, estudantes que faltam", diz.
A hipótese mais provável para a série de panes, diz Ejzenberg, é que tenha havido "atração" de público para o sistema de trens da CPTM sem que tenha ocorrido preparação da rede para receber tantos passageiros.
O Ministério Público abriu inquérito no início deste ano para investigar as panes sucessivas ocorridas nos trens da CPTM. Segundo o promotor Maurício Antônio Lopes, é necessário saber se houve redução no orçamento aplicado na rede ferroviária. Ele se reuniu com diretores da empresa na quinta-feira (29) e pediu uma compensação com relação à pane ocorrida na Linha 9-Rubi.
No limite
O secretário dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, admite que "a rede aérea [de trens] está no limite", mas nega que esteja havendo caos. "A demanda reprimida é muito grande. Pagamos o preço do nosso sucesso", disse ele, em entrevista coletiva nesta quinta-feira.
A secretaria relata estar trocando os sistemas de alimentação de energia das estações da CPTM. Serão construídas novas substações de energia em todas as linhas, ainda de acordo com a pasta. Com relação ao problema na Linha 7-Rubi, o secretário considerou que, se as pessoas não tivessem saído do trem, na quinta, a pane elétrica seria resolvida rapidamente. A falha começou às 7h e estava restrita ao trecho entre as estações Barra Funda e Luz, ainda de acordo com Fernandes.
O secretário avalia que o problema da superlotação da CPTM está vinculado ao aumento da integração com o Metrô, em especial a Linha 4-Amarela. "Foi um tsunami. A CPTM está tendo que se desdobrar para lidar com esse tsunami [de usuários] que aconteceu", disse.
Outros fatores
Para Jaime Waisman, professor de engenharia de transportes da Universidade de São Paulo (USP), três fatores levaram ao boom de passageiros na CPTM e no Metrô: a integração com o Bilhete Único, que permite pagar tarifa mais barata pelo transporte, o congestionamento nas ruas de São Paulo e o bom momento econômico.
"Como isso repercute: há uma queda notável no nível de conforto para os passageiros. Os trens deixam de estar lotados nas horas-pico e ficam lotados praticamente o dia todo", diz o professor. Ele ressalta que a tendência de crescimento é inevitável, mesmo nos próximos anos. "As pessoas estão dispostas a deixar o carro e ir de trem e Metrô porque é mais rápido e barato. As vantagens do sistema trabalham contra ele", afirma.
Apesar de ser inevitável que mais gente use esse tipo de transporte, Waisman prevê um crescimento em ritmo mais lento nos próximos anos. "O grande pulo se deveu ao Bilhete Único. Eu diria que a tendência é de uns 20% de crescimento ao ano, até 2015", disse.
Na análise individual das linhas da CPTM, a 9-Esmeralda foi a que mais cresceu nos últimos anos. O número de passageiros mais do que triplicou, comparando os dois primeiros meses de 2007 com o mesmo período de 2012. Há cinco anos, havia apenas 5 milhões de usuários, número que chegou a 20,8 milhões só neste ano. A Linha 9 ficará fechada em trechos até maio, sempre aos domingos, para obras de modernização que devem custar R$ 307 milhões.
O excesso de passageiros é um dos grandes fatores de desgaste dos trens da CPTM e do Metrô, diz Waisman. "Mais lotação implica em mais gente segurando as portas, deixando coisas caírem nos trilhos, provocando algum acidente, o que prejudica a operação."
Investimento
A bancada do PT na Assembleia Legislativa protocolou na quinta representação junto ao Ministério Público Estadual em que pede a abertura de inquérito para apurar supostas irregularidades na prestação do serviço da CPTM e as responsabilidades dos gestores públicos nos acidentes e panes ocorridas. A representação requer, também, que seja apurada se há falta de investimento.
O PT diz ter documentos enviados pela CPTM à Assembleia Legislativa que provam diferença de R$ 700 milhões entre o que a CPTM reivindicou e o que foi efetivamente aprovado no orçamento da companhia em 2012: de R$ 1,75 bilhão para R$ 1,05 bilhão. Para a linha 7, a CPTM teria apontado a necessidade de R$ 284 milhões e o valor definido pelo governo foi de R$ 101 milhões, ou seja corte de R$ 183 milhões, que significa redução de 64% do orçamento no investimentos na linha.
Fonte: G1